sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

EUA ajudaram a Lava Jato a monitorar Lula e Dilma

Secretaria do MPF responsável pelos acordos de cooperação internacional admite ao GGN que 
não participa das "negociações" entre a força-tarefa de Curitiba e oficiais estadunidenses. 
Defensor de Lula, Cristiano Zanin suspeita que irregularidades vão além de acordos de 
cooperação internacional secretos.

Cíntia Alves



Jornal GGN - A defesa de Lula suspeita que além de a Lava Jato exportar irregularmente seus principais delatores para ajudar em procedimentos secretos nos Estados Unidos, a força-tarefa também aceita auxílio de autoridades estrangeiras, em território nacional, ou fazem uso de tecnologia por elas ofertadas, com o intuito de enquadrar o ex-presidente da República, entre outros objetivos.
Em entrevista ao GGN, realizada por e-mail, nesta quinta (8), o advogado Cristiano Zanin Martins questionou os métodos usados pela força-tarefa para monitorar o ex-presidente. Ele citou, inclusive, o episódio em que o juiz Sergio Moro vazou para a imprensa o áudio de uma conversa entre Lula e Dilma Rousseff, material que fomentou a tempestade perfeita para o impeachment.
"O que estamos vendo é que agentes públicos que integram a força-tarefa da Lava Jato estão atuando em conjunto com agentes estrangeiros, inclusive em território brasileiro, sem que haja qualquer formalização dessa cooperação. Isso parece estar ocorrendo não só em relação a delações premiadas internacionais, mas também em relação a atos de investigação e inteligência policial", disse Zanin.
"Há agentes estrangeiros participando de monitoramento telefônicos, de análises cibernéticas? Que tecnologia foi utilizada para separar e divulgar, em apenas duas horas, uma conversa captada sem autorização judicial entre a então Presidente Dilma e o ex-Presidente Lula? São essas e outras situações que precisam ser esclarecidas, até porque há condutas penalmente relevantes que podem, em tese, estar sendo cometidas por determinados agentes públicos brasileiros", acrescentou.
Zanin é um dos integrantes da banca de advogados que defende Lula no caso triplex, que está nas mãos do juiz federal de Curitiba, Sergio Moro - classificado pelo procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal na capital paranaense, como o "símbolo da Lava Jato".
Moro, nas audiências do caso triplex, atendeu a pedidos do MPF e impediu que a defesa de Lula fizesse perguntas a delatores da Lava Jato sobre eventuais acordos de colaboração premiada com os EUA. Em uma das últimas oitivas, o magistrado chegou a dizer que não iria por em risco um eventual acordo com o Estados Unidos por "mero capricho" da defesa de Lula.
Os advogados tentam, sem muito sucesso, abordar o elo suspeito entre a força-tarefa e autoridades estadunidenses numa tentativa de demonstrar que as irregularidades cometidas colocam em xeque o valor das delações obtidas contra Lula. Até agora, pelo menos quatro testemunhas usadas contra o petista sinalizaram que foram abordados por agentes da terra de Donald Trump. Um deles, inclusive, deixou escapar que procuradores da Lava Jato intermediaram a conversa em solo tupiniquim.
A atuação de Moro para favorecer a Lava Jato e impedir que as suspeitas sobre os acordos com os Estados Unidos sejam esclarecidas representa um obstáculo a mais à defesa de Lula, avalia Zanin.
"A testemunha não pode se recusar a esclarecer um fato perante a Justiça brasileira sob o argumento de que tem uma 'cláusula de confidencialidade' com órgãos internacionais. O documento sequer foi mostrado. Mas mesmo que isso tivesse ocorrido, jamais poderia servir para impedir a realização de atos de instrução que estão sendo realizados pela Justiça do nosso País."
O silêncio das testemunhas, autorizado por Moro, ofendem a legislação nacional e a soberania política do Estado brasileiro, prevista na Constituição.
ACORDO DE COOPERAÇÃO SUSPEITO
Dentre as questões feitas pela defesa de Lula que são censuradas pelo juiz Sergio Moro está a possibilidade de a Lava Jato ter intermediado acordos de colaboração entre seus delatores e agentes do Departamento de Justiça estadunidense tangenciando o Estado brasileiro, ou seja, sem participação das autoridades centrais desse país.
O decreto nº 3.810/2001, que versa sobre como devem se dar as ações conjuntas entre Brasil e Estados Unidos, prevê um procedimento específico para solicitações de cooperação entre Brasil e Estados Unidos em matéria de investigação, inquérito, ação penal e, "ao que parece, esse procedimento não foi observado. Ao contrário, pelo que se vê tudo está ocorrendo de modo informal e voluntarista, sem possibilidade de controle", disparou Zanin.
O artigo II do decreto diz que cada país designará uma "Autoridade Central" para enviar e receber solicitações de cooperação. No Brasil, a autoridade central será o Ministério da Justiça, que na prática transferiu essa responsabilidade para a Procuradoria-Geral da República através da Secretaria de Cooperação Internacional (SCI).
Mas a SCI, hoje capitaneada pelo procurador da República Vladimir Aras, admitiu ao GGN que os procuradores de Curitiba abriram um canal direto com as autoridades estadunienses, ou seja, que qualquer cooperação que esteja em curso está ocorrendo não apenas sem a participação do Ministério da Justiça, mas à revelia da Procuradoria-Geral da República, comandada por Rodrigo Janot. Consultado pela reportagem, Aras disse que as questões sobre Lava Jato e Estados Unidos devem ser cobradas exclusivamente da força-tarefa de Curitiba "porque a SCI não participa dessa negociação".
Procurada, a força-tarefa de Curitiba não quis comentar o caso.  
Sem transparência do que ocorre entre a Lava Jato e autoridades dos EUA, o processo de Lula, na visão de Zanin, fica prejudicado. Como também fica prejudicada a soberania nacional, uma vez que não há controle do Poder Executivo sobre o que a Lava Jato está oferecendo aos EUA.
No artigo publicado no UOL, Anderson Bezerra Lopes apontou que os delatores da Lava Jato podem entregar aos EUA informações preciosas sobre as operações da Petrobras, colaborando para a deterioração da economia nacional.
"Em nenhuma hipótese é admissível que agente de Estado estrangeiro ingresse no território brasileiro para atividades de investigação criminal sem expressa celebração de acordo de cooperação. (...) Não é admissível o fornecimento de informações e documentos de caráter estratégico que estejam relacionados com a defesa nacional. Neste ponto, é preciso recordar que algumas dessas testemunhas ocuparam os mais altos postos de direção da Petrobras e, nessa condição, tiveram acesso a informações e documentos sigilosos acerca dos recursos naturais (por exemplo, gás e petróleo) e da política energética brasileira."
Para Lopes, a Lava Jato está sujeita a ser investigada por crime de traição à pátria, se as suspeitas se confirmarem.
Na visão de Zanin, a Constituição em seu artigo 127 obriga o Ministério Público a defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis. "E é a mesma Constituição que estabelece como um dos fundamentos da República a sobenania, de modo que o País deve assegurar a independência nacional nas suas relações internacionais. A Constituição também estabelece que o mercado interno integra o patrimônio nacional, dentre outros fundamentos de proteção à economia."
O espaço está aberto para o posicionamento dos procuradores.

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